Foi sentado aos pés da avó, Rosa Alvina, que o cineasta cearense Arthur Leite passou a infância ouvindo histórias maravilhosas sobre a vida em Belém do Pará e na Amazônia. Ainda criança, Arthur conta que se imaginava vivendo grandes aventuras embreado pelo mato e a vida que teria junto aos avós no norte do país.
“Eu recriava essas histórias na minha mente de maneira bastante cinematográfica, mesmo para uma criança. E foi nessa idade que eu descobri que queria fazer cinema. Eu não tinha uma noção clara do que era ficção ou documentário, eu sabia que queria contar histórias”, conta.
História dos avós
Não é de se admirar que, na vida adulta e com uma câmera na mão, fosse justamente a história dos avós que o jovem decidisse relatar em seu primeiro documentário, Abissal. “O documentário nasceu da maneira mais improvável possível. Na verdade, todo esse material deveria ser para pesquisa e desenvolvimento de uma personagem ficcional, a Vera, de uma minissérie que escrevi e irei dirigir, em breve, criada dentro do Laboratório de Audiovisual para TV do Porto Iracema das Artes e do Instituto Dragão do Mar”, conta.
A ideia da minissérie “Caminhos de Volta” era mostrar, com um pé na realidade, o reencontro do casal Vera e Stenio, que passa 40 anos separados. “A protagonista da minissérie, diretamente inspirada na minha avó, foi bastante difícil de desenvolver, por ser uma personagem tão complexa e, ao mesmo tempo, uma pessoa próxima a mim”, aponta.
O trabalho de curso, que a princípio tinha como objetivo conhecer mais da história do avô, Durval, acabou se revelando um caminho de descoberta da própria descendência.
“Minha avó não gostou muito a ideia de ter fatos da sua vida se transformando em produto de televisão e, durante todo o período do LabTV, negou-se a me dar uma entrevista. Curiosamente após o término do laboratório, a vovó me ligou por conta própria e questionou se eu ainda tinha interesse na entrevista. Mas minha avó não falava do meu avô, mas dela própria, com o vovô sempre como coadjuvante. Percebi que a verdadeira desconhecida da história era minha própria avó. Minha cabeça virou um turbilhão, eram muitas informações novas, segredos, vinganças e detalhes que deixariam até Vera, minha avó ficcional da minissérie, boquiaberta”, explica.
Narrativa da avó
Arthur explica que a partir daquele momento não havia como deixar toda a história, que ouvira chocado, apenas na ficção. A narrativa em primeira pessoa da avó acabou por se tornar um documentário que não apenas fala sobre as relações afetivas, mas, também, das nuances do ser humano, chegando a extrapolar para discussões que permeiam a atualidade, como as questões de gênero.
“Me deparei com segredos e sentimentos tão profundo que fizeram ficar submerso em tanto material gravado. Literalmente afogado em memórias. Abissal é a parte mais profunda do oceano e eu acabara de descobrir o lado mais profundo da minha avó”, explica.
E foi toda essa imersão na própria história, de quase três anos, que trouxe a Arthur a nomeação de Melhor Documentário Brasileiro de Curta-metragem do prêmio ‘É Tudo Verdade’ 2016. Seu documentário Abissal, de 17 minutos, foi eleito de forma unânime pelo juri do prêmio e agora está em pré-qualificação ao Oscar 2017 de Melhor Curta Documentário.
Cearense no Oscar
Mesmo com a importante indicação, o diretor aponta que os objetivos para o futuro é continuar falando do cearense e do brasileiro e afirma querer fazer um cinema com menos glamour. “É um sentimento incrível saber que meu filme, Abissal, será visto pela Academia de Ciências Cinematográficas de Hollywood e poderá representar o Brasil na disputa pelo seu primeiro Oscar. Agora é torcer para a indicação e chegarmos à final. Óbvio que é um prazer e gera uma visibilidade muito positiva, mas meu objetivo mesmo é continuar fazendo filmes aqui, com cara de Brasil e da nossa gente. Mais cinema e menos glamour!”, destaca.
O jovem já tem ensaiado a lista de agradecimentos ao envolvidos no projeto e a quantidade de nomes é enorme. “Agradeço as minhas melhores amigas, Bárbara Cariry (produtora executiva) e Danielle Rotholi (assistente de direção) por terem embarcado nessa comigo. Não podem faltar agradecimentos, também, ao Porto Iracema das Artes e a Unifor, na figura muito especial da Bete Jaguaribe e do Valdo Siqueira e dos tutores e amigos Karim Ainouz, Sérgio Machado e Marcelo Gomes. E, claro, muito obrigado à minha família, principalmente à minha avó Rosa, sem ela esse filme não existiria”, enumera.
Arthur tem escrito o documentário em outros prêmios no Brasil e no exterior. O diretor conta que a torcida não poderia estar maior após a primeira premiação. “É muito especial saber que logo após a primeira exibição do meu documentário, a certeza de que o próximo filme, Ferrugem, outro documentário e que já está gravado, terá a finalização garantida e estará pronto para 2017. E fora esse novo documentário, já tenho um roteiro de ficção: Cor de Sangue, pronto para ser rodado, e estamos em processo de captação para a realização da minissérie “Caminho de Volta”. Pelo visto 2016 e 2017 não darão trégua. Mãos à obra”, finaliza, animado.
Fonte: Tribuna do Ceará
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