A 14 ª fase da Operação Lava Jato deveria chamar-se Operação Apocalipse, mas o comando da força-tarefa preferiu a citação latina, mais edificante, Erga Omnes, “contra todos” – perante a lei não há privilégios.
Mas a imprensa – sobretudo a hebdomadária – sempre agarrada à possibilidade de grandes emoções e trepidações, preferiu enxergar na prisão dos presidentes da Odebrecht e Andrade Gutierrez (as duas maiores empreiteiras do país com obras nos quatro cantos do mundo), uma espécie de fim do mundo.
CartaCapital, que fecha às quintas-feiras, evidentemente não conseguiu noticiar uma fato que ocorreu horas depois, na manhã da sexta-feira. Lástima: seria interessante comparar a sua entonação com as dos outros semanários. Certamente seria mais contida, menos histérica, sem aquela aposta de fim dos tempos.
Na apresentação de Veja, a ilusão de que a Polícia Federal está a um passo de prender o ex-presidente Lula. Na de Época, o suposto desafio dos Odebrecht ao governo: “Terão de construir três celas” (uma para o pai e antecessor de Marcelo, Emílio, outra para Lula e a terceira para Dilma).
Sem fôlego
Este é o estado do nosso jornalismo contemporâneo escancarado, sem inibições, por duas das maiores empresas de mídia brasileiras (Grupo Globo e Abril): no lugar de fatos e respectivas implicações, fantasias e inferências. Em vez de evidências e comprovações, conjecturas delirantes. A grande mídia quer porque quer pegar o ex-presidente Lula e não perde uma oportunidade para fomentar a imaginação dos seus leitores.
O governo Dilma não pode estar por trás do cerco da força-tarefa às grandes empreiteiras como as reportagens tentam evidenciar, a não ser que estivesse dominado por um surto suicida. Ao contrário, o governo prefere que as investigações fiquem circunscritas à esfera da Petrobras de modo que as empreiteiras possam continuar operando em outros projetos e obras sem engrossar a crise econômica.
A Operação Lava Jato está em curso há cerca de 460 dias e os nossos jornalistas investigativos ainda não conseguiram perceber que, desta vez, as investigações que contam e produzem resultados são as empreendidas pelo Estado, alheias ao voluntarismo dos grupos de mídia.
A imprensa está a reboque dos eventos, sem fôlego sequer para produzir balanços; e assim ficará, exangue e inapetente, enquanto seus paradigmas e doutrinas continuarem ditados pelas redes sociais.
(por Alberto Dines em 23/06/2015 na edição 856 do Observatório da Impressa)
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