sexta-feira, 5 de junho de 2015

Gil justifica Show em Israel apesar do apelo internacional de cancelamento


Em carta aos baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso, o baixista Roger Waters, nome dos mais fortes na militância artística internacional, pede que eles cancelem apresentação marcada para o dia 28 de julho em Tel­-Aviv, Israel.

"Caros Gilberto e Caetano, os aprisionados e os mortos estendem as mãos. Por favor, unam­se a nós cancelando seu show em Israel", escreveu. Uma página foi criada na internet com o mesmo propósito, intitulada "A Tropicália não combina com Apartheid". Mais de 10 mil assinaturas pedem o boicote dos brasileiros aos palcos israelenses.

Em entrevista ao jornal o Estado de São Paulo, Gil responde ao assunto. Sua atitude é a de ir a Tel-­Aviv para não penalizar uma plateia que, como diz, é formada por muitos fãs de música brasileira que não apoiam as políticas agressivas do Estado de Israel contra o povo palestino.

Abaixo os principais trechos da entrevista:

Ao saber de sua apresentação com Caetano Veloso em Tel­Aviv, Roger Waters mandou uma carta falando para não irem, pedindo o boicote a Israel como uma forma de protestar contra os bombardeios ao povo palestino e à ocupação dos territórios. Há também uma mobilização nas redes sociais que pede o mesmo. O que você responde a Roger Waters?

Eu respondo que não tenho muito interesse em misturar a posição discutível do Estado de Israel com o povo de Israel, que tem uma vida, uma cultura e uma dimensão simbólica. Pessoas que gostam de música brasileira e que têm um apreço por esta música há muitos anos. Eu vou lá por isso, vou lá por eles. 

E sendo assim, você pensa em dizer algo durante a apresentação a respeito do conflito?

Sim, é uma possibilidade. Mas veja, essa mesma questão de não ir já surgiu nas três últimas vezes em que anunciei que iria a Israel. Muita gente pediu que eu não cantasse. Uma das razões de eu estar indo hoje (5) é justamente essa, de eu já ter passado por essa questão outras vezes. Uma das coisas que digo sempre é que, para mim (o problema é) o próprio fato da escolha do povo israelense de manter ali seu Estado depois da Segunda Guerra, de não ter aceito uma oferta para fazer o Estado de Israel em outra região para evitar esses problemas de território, clássicos problemas bíblicos da posse da terra, a questão das 12 tribos e tudo mais, eu falo dessas coisas. Falo sempre disso, o que é uma maneira de chamar a atenção para a permanência desse problema e de como tudo isso poderia ter sido evitado. E do que ainda pode ser evitado. Há também minha posição contrária à ocupação das terras (por parte de Israel) e à construção do muro (o Muro da Cisjordânia, também conhecido como Cerca da Separação). E, ao mesmo tempo, existem coisas odiosas também do outro lado (dos palestinos), como a existência dos homens­bomba. Então, há uma situação muito complicada para se tomar um partido único e punir boa parte do povo de Israel, boa parte pacífica e interessante desse povo. É complicado simplesmente fazer boicote.

As últimas imagens que chocaram o mundo mostraram Israel bombardeando escolas e orfanatos em 2014. É citando essas imagens que a comunidade artística internacional tem pedido o boicote aos palcos israelenses.

Sim, mas, ao mesmo tempo, tem um povo que está lá em Israel com a opinião dividida. Há uma parte significativa que apoia uma visão mais harmoniosa, um desejo de convívio mais harmonioso que condena as atitudes duras do governo. Ir cantar em Israel é também apoiar essa parte, apoiar um Israel pró­ativo, um Israel mais palestino.

Um Israel palestino?

Sim, vou cantar em Israel para um Israel palestino. 

Você e Caetano são sempre cobrados por atitudes políticas...

Sim, isso por causa da ditadura, do tropicalismo.

Podemos pensar ao mesmo tempo que, a partir dos anos 1980, vocês romperam com o maior engajamento social? A palavra seria rompimento?

O que existe é uma fragmentação dos engajamentos, dos interesses das lutas. É assim que se caracteriza a sociedade de hoje. É a micro manifestação de particularidades variadas do ponto de vista de perfis ideológicos e lutas políticas que provocam isso. Não há mais a frente única como havia nos anos 70.

Mas os problemas sociais gerais ainda existem. Os escândalos políticos, a violência a facadas no Rio de Janeiro. Mesmo nesses episódios de tragédia não se ouve mais a voz do artista.

Como não? Ouve­-se ,sim, mas ela está misturada no alarido, na algaravia do vozerio da internet. Essa entrevista nossa é bem isso. São vários assuntos, vários temas, o passado contra o futuro, a inovação, o reacionarismo contra a abertura e a defesa da harmonia social. É isso.

Fonte: Jornal o Estado de São Paulo

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