sábado, 24 de outubro de 2015

O Dono do Poder: ocupação da SecultFOR!



Qual o significado dos sete dias do movimento de Ocupação da sede da Secretaria de Cultura de Fortaleza? Para alguns, ato arbitrário, drástico, irresponsável. Para outros, a mais legítima apropriação de “todo poder que emana do povo”, ou seja, sem nenhum penduricalho metaeufórico, o povo ocupando o seu devido lugar!

A Constituição brasileira garante e EXIGE a nossa participação, por meio de representantes ou não, na consecução dos objetivos fundamentais da República: (1) construir uma sociedade livre, justa e solidária; (2) garantir o desenvolvimento nacional; (3) erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; (4) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Ora, viemos de uma longa trajetória – não gostaria de usar aqui o termo “cultura” – de carneirinhos, de gado que espera a ruminar a hora do abate, de injustos escambos, troca de nossas riquezas por espelhinhos – mesmo assim não nos enxergávamos –, bugigangas e migalhas. Por isso, alguns mais passadistas, ou mesmo aqueles eternos “amigos do rei”, se incomodam por qualquer comportamento reivindicatório, qualquer protesto que suba a mesa, qualquer dedo erguido em riste, qualquer reclamação que se faça em prol do coletivo. Para eles, infelizmente, ainda muitos, apenas o individualismo prospera, numa rede incontável de vantagens pessoais, da falta de vergonha pelo costumeiro beija-mão em temerosas e obscuras transações.

A questão é dinheiro? É aumentar o valor do edital? Sim, é também, dentre muitas outras coisas, entre elas (1) fortalecermos as instituições e definirmos políticas públicas (como a de editais) que assegurem o direito constitucional à cultura; (2) protegermos e promovermos o patrimônio e a diversidade étnica, artística e cultural; (3) ampliarmos o acesso à produção e fruição da cultura; (4) inserirmos a cultura em modelos sustentáveis de desenvolvimento socioeconômico e (5) estabelecermos um sistema público e participativo de gestão, acompanhamento e avaliação das políticas culturais. E quem nos orienta isso? Deus? Freud? Marx? Não, mas o Plano Nacional de Cultura, um documento que, como dezenas de outros, já passou do tempo de sair do papel para o encantado e dormente mundo real.

A cultura no Ceará sempre foi relegada a últimos planos, vista como luxo, coisa supérflua, mero entretenimento – e os artistas como gente desocupada, louca, preguiçosa –, quando na realidade não podemos pensar em desenvolvimento sem pensar em cultura, pois não há liberdade, dignidade, identidade nem espírito sem o seu reconhecimento, sem a sua promoção.

Em seu artigo 215, a Constituição nos sussurra, enquanto dormimos, que “o Estado garantirá A TODOS o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.”.

O Estado pode até cochilar, se perder no sacolejar das pernas da Ivete Sangalo, mas nós, artistas, produtores culturais e cidadãos da sociedade civil, não. Temos que nos esforçar para estarmos juntos, para nos mobilizar seja da forma que for, presencial ou não, em prol da causa da cultura (ainda) praticada e recolhida nos baús cearenses. Essa cultura que é tratada, de forma geral, como obséquio, com todo o desrespeito necessário para sua extinção. Aliás, lamentamos haver alguns que acreditem que “artista bom é artista morto”. Vivo, não vale um milhão; Morto, glórias e lágrimas em palanques! Repito: direito só é direito quando conquistado. Não precisamos de favor de senhor ninguém. Quem integra as instâncias culturais nos devem todos ouvidos e manga arregaçada. As pastas institucionais são do povo. Os partidos que se lixem e que viva e deixe viver a cultura!

Coluna do Raimundo Neto - O Povo

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